AGC deve deliberar sobre plano alternativo também na hipótese de cram down

Uma das muitas alterações na dinâmica dos processos de recuperação de empresas realizadas pela reforma de 2020 na Lei 11.101/2005 foi a possibilidade de apresentação de plano alternativo por parte dos credores.
Desde o primeiro contato com a, então, novidade, a nossa impressão sempre foi a de que se tratava de medida bastante específica, cabível apenas em casos muito pontuais. De certa forma, o tempo que se passou desde a publicação da Lei 14.112/2020 confirma aquela percepção inicial, uma vez que se trata de expediente incomum no cotidiano das recuperações judiciais.
E antes de prosseguirmos vale um esclarecimento. Quando dissemos que o plano alternativo tem cabimento para casos mais específicos, não estávamos a criticar referida ferramenta. Ao contrário, pois é importante que a legislação também consiga dar resposta aos problemas mais complexos e menos corriqueiros. Portanto, não é sobre sermos ou não entusiastas do tema, mas apenas reconhecermos que, apesar de sua importância, a sua utilização é restrita.
De toda sorte, a proposta aqui não é tratar sobre o plano alternativo, suas condições, seus requisitos ou suas eventuais vantagens e desvantagens. Esse não será um texto sobre plano alternativo, mas sobre um ponto bastante específico que, aparentemente, tem passado despercebido em muitos processos. [1]
Rejeição pela assembleia do plano do devedor
A Lei 11.101/2005 prevê a possibilidade de apresentação de plano de recuperação judicial por parte dos credores em duas situações. De acordo com o § 4º-A, do artigo 6º, o término do prazo de 180 dias de suspensão das ações “sem a deliberação a respeito do plano de recuperação judicial proposto pelo devedor faculta aos credores a propositura de plano alternativo”.
A outra hipótese é quando o plano de recuperação judicial do devedor é rejeitado em assembleia. Neste caso, “rejeitado o plano de recuperação judicial, o administrador judicial submeterá, no ato, à votação da assembleia-geral de credores a concessão de prazo de 30 dias para que seja apresentado plano de recuperação judicial pelos credores [2]“, conforme artigo 56, § 4º, da Lei 11.101/2005.
Nem todos enxergam a hipótese prevista no § 1º, do artigo 58, da Lei 11.101/2005, como sendo de rejeição pelos credores do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor e colocado para deliberação assemblear. Da mesma forma em que há controvérsia na literatura a respeito da profundidade da decisão judicial prevista no citado parágrafo. Sobre isso, veja, por exemplo, a diferença no tratamento dado ao assunto por Fábio Ulhoa [3] — para quem há discricionariedade judicial na concessão da recuperação judicial com base no § 1º, do citado artigo 58 — e por Marcelo Sacramone [4], que sustenta não haver nenhuma margem de discricionariedade caso preenchidos os requisitos dos §§ 1º e 2º, do artigo 58, da Lei 11.101/2005.
Seja como for, independentemente da existência ou não de alguma discricionariedade judicial na hipótese do § 1º, do artigo 58, da Lei 11.101/2005, parece-nos razoavelmente claro que, caso o juiz não conceda a recuperação judicial, deverá decretar a falência. É o que, desde a reforma de 2020, está expresso na Lei 11.101/2005, em seu artigo 58-A, que prevê que “rejeitado o plano de recuperação proposto pelo devedor ou pelos credores e não preenchidos os requisitos estabelecidos no § 1º do art. 58 desta Lei, o juiz convolará a recuperação judicial em falência.”
Dito isso, soa-nos possível afirmar que, ainda que não se reconheça que a hipótese prevista no § 1º, do artigo 58, da Lei 11.101/2005, seja de rejeição do plano de recuperação judicial, o fato é que, se o juiz entender que não é o caso de concessão da recuperação judicial — pela ausência dos requisitos, por exemplo —, o efeito é o mesmo dela: a convolação da recuperação judicial em falência.
Por mais que, em dezembro deste ano, complete cinco anos da reforma realizada na Lei 11.101/2005 pela Lei 14.112/2020 [5], a situação descrita acima parece não ter sido totalmente notada, pois não é sempre que verifica que foi colocado à deliberação da assembleia de credores a possibilidade de apresentação de plano alternativo, quando, na mesma assembleia, o quórum do artigo 45 não foi alcançado, mas alcançou-se o previsto no § 1, do artigo 58, ambos da Lei 11.101/2005. [6]
Fonte: https://www.conjur.com.br/2025-mai-03/a-agc-deve-deliberar-sobre-o-plano-alternativo-tambem-na-hipotese-de-cram-down/